A Tentação de Jesus

A Tentação de Jesus
Texto: Mateus 4:1-11

Introdução

Na semana passada, vimos a preparação de Jesus para o ministério por meio de Seu batismo no Jordão. Mas havia outra preparação que Deus tinha para Ele antes que Ele pudesse começar Seu ministério público, e esse foi um período de provação no deserto. Assim como Adão e Eva foram provados no Jardim, e assim como Israel foi provado no deserto, Jesus teve que passar por Seu tempo de prova em preparação para o ministério.

Esta passagem é única para Jesus como o Filho de Deus e um padrão para nós como crentes em Cristo. Todos nós somos tentados a pecar. Não passa um dia sem que os dardos inflamados do inimigo nos ataquem. A alma de todo verdadeiro crente angustia-se com o impulso da tentação, sabendo que ceder ao pecado entristece o Espírito Santo que nos selou para o dia da redenção e impede nossa comunhão com Cristo.

Existe alguma esperança para sermos libertos da armadilha da tentação? Esta passagem nos diz “Sim”, nossa esperança é encontrada no Filho de Deus, Jesus Cristo! Tendo sofrido tentação em todos os sentidos que somos, mas sem pecado (Hb 4:15), Ele é capaz de socorrer aqueles que são tentados (Hb 2:18). Ele conhece nossas fraquezas; Ele entende a atração dos desejos humanos e a ferocidade dos ataques de Satanás. E Ele nos mostrou como combater a tentação no poder do Espírito pela Palavra de Deus. A tentação de nosso Senhor é triunfante e instrutiva, e continua sendo uma garantia de que o Senhor sabe como livrar os piedosos da tentação (2 Pe 2:9).

Este texto enfatiza o fato de que Jesus era o “Filho de Deus” (Mt 4:3, 6). Lembre-se de que este relato segue diretamente após Seu batismo por João no Jordão (Mt 3:13-17), onde Deus Pai declarou “Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo” (Mt 3:17). Sabemos que o Novo Testamento afirma tanto a divindade quanto a humanidade de Jesus Cristo. Vimos Sua genealogia humana em Mateus 1:1-17. Mas também vimos Sua genealogia divina quando Ele foi concebido pelo Espírito Santo (Mt 1:20).

A Bíblia declara que “Deus não pode ser tentado pelo mal” (Tiago 1:13). No entanto, o Deus-Homem, Jesus Cristo foi tentado. Como homem, Jesus enfrentou a tentação, mas como Deus, Ele não podia ser tentado, nem podia pecar. Os teólogos chamam isso de impecabilidade de Cristo. Pode-se argumentar que a impecabilidade de Cristo é uma função de sua divindade, mas não deve ser tomada para mitigar sua humanidade, e a tentabilidade de Cristo é uma função de sua humanidade, mas não deve ser tomada para mitigar sua divindade. Este é o mistério da natureza do Deus-homem Jesus Cristo. Como o batismo de Jesus declarou que Ele era Rei, Sua tentação demonstrou que Ele é Rei.

O texto de Mateus 4:1-11 é cheio de verdades espirituais e exemplos. Poderíamos fazer um estudo inteiro sobre as estratégias de Satanás: como ele ataca durante uma fraqueza (Jesus estava com fome), depois de uma vitória (Jesus tinha acabado de ser batizado) e antes de um ministério (Jesus estava prestes a começar).

Poderíamos fazer um estudo inteiro sobre a natureza da tentação: tentação física (envolvendo pão), tentação emocional (envolvendo segurança e proteção), tentação espiritual (envolvendo adoração). Poderíamos relacionar cada uma delas às tentações de Eva no Jardim e às três categorias das coisas do mundo, “a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida” que 1 João menciona.

Poderíamos fazer um estudo inteiro sobre como vencer a tentação: como Jesus seguiu a liderança do Espírito Santo; como Ele respondeu com as Escrituras; e como Jesus resistiu ao diabo e ele o “deixou”.

E sim, aplicaremos algumas dessas ideias do texto. Mas nosso principal propósito é ver Jesus como Mateus O apresenta aqui. Mateus quer que vejamos a tremenda obediência de Jesus para ver uma verdadeira demonstração de Sua justiça. Pois é em Sua tentação que a verdadeira natureza de Jesus como o Rei vitorioso vem brilhando.

1. O Cenário da Tentação (Mt 4:1-2)

Permitam-me fazer algumas observações importantes sobre o cenário da tentação de nosso Senhor.

Primeiro, a experiência de nosso Senhor no deserto O identificou com a nação de Israel no Antigo Testamento.

“Então, foi conduzido Jesus pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo. e, tendo jejuado quarenta dias e quarenta noites, depois teve fome” (Mateus 4:1-2).

Mateus já ligou Jesus a Israel por Sua genealogia (Mt 1:1-17) e pelo cumprimento da profecia (Mt 2:13-23). ​​O número 40 e o deserto conectam Jesus novamente com a nação de Israel. O “deserto não é apenas um lugar associado à atividade demoníaca (Is 13:21; 34:14; Mt 12:43; Ap 18:2), mas o lugar onde Israel experimentou suas provas iniciais. Assim como Israel primeiro passou por seu “batismo (“todos foram batizados em Moisés na nuvem e no mar”, 1 Co 10:2) e então foi levado ao deserto por 40 anos onde Deus os provou, então, após Seu batismo, Jesus foi testado no deserto por 40 dias. Moisés lembra Israel de suas provações em Deuteronômio 8:

“Todos os mandamentos que hoje vos ordeno guardareis para os fazer, para que vivais, e vos multipliqueis, e entreis, e possuais a terra que o SENHOR jurou a vossos pais. E te lembrarás de todo o caminho pelo qual o SENHOR, teu Deus, te guiou no deserto estes quarenta anos, para te humilhar, para te tentar, para saber o que estava no teu coração, se guardarias os seus mandamentos ou não. E te humilhou, e te deixou ter fome, e te sustentou com o maná, que tu não conheceste, nem teus pais o conheceram, para te dar a entender que o homem não viverá só de pão, mas que de tudo o que sai da boca do SENHOR viverá o homem” (Deuteronômio 8:1-3)

Jesus cita esse versículo em Sua resposta à primeira tentação. Novamente vemos que Jesus é o “verdadeiro Israel” e o “verdadeiro Filho de Deus”. Enquanto Israel falhou em suas provas, Jesus foi vitorioso, o que mostra que Ele é qualificado como o Rei que expiaria nossos pecados na cruz e que julgará o mundo com fogo.

Em segundo lugar, quero que você observe que “Jesus foi levado pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo” (Mt 4:1). O Evangelho de Marcos é ainda mais forte, dizendo “o Espírito o impeliu ao deserto” (Mc 1:12). Jesus foi compelido pelo Espírito a este lugar deserto para ser tentado.

O Espírito Santo desempenhou um papel significativo na vida de nosso Senhor durante os 40 dias de jejum e tentação. Veremos que Jesus confiou na Palavra de Deus para lutar contra o diabo. Assim, foi tanto a Palavra de Deus quanto o Espírito de Deus que guiaram e capacitaram nosso Senhor enquanto Ele prevalecia sobre Satanás em Sua tentação.

Terceiro, o tentador era o diabo. A palavra grega diabolos significa estritamente “caluniador”; mas o termo é a tradução regular na tradução grega do hebraico “Satanás” (por exemplo, 1 Crônicas 21:1; Jó 1:6–13; 2:1–7; Zacarias 3:1–2). Ele é o principal opositor de Deus, o arqui-inimigo que lidera todas as hostes espirituais das trevas (Gn 3; 2 Sm 19:23; João 8:37–40; 1 Co 11:10; 2 Co 11:3; 12:7; Ap 12:3–9; 20:1–4; 7–10).

Quarto, Jesus foi tentado no deserto durante todo o período de 40 dias.  Você pode ter a impressão de que Jesus foi levado ao deserto por 40 dias e noites e então foi tentado no final deste período. Mas Marcos e Lucas registram que Jesus estava “sendo tentado por quarenta dias pelo diabo” ( Lucas 4:2; também Marcos 1:13). As três tentações que Mateus e Lucas registram ocorreram no final de 40 dias, mas todo esse período foi um tempo de prova e tentação. A palavra “tentado” pode significar tanto provar quanto tentar. Como algo que o diabo faz, deve aqui ser tomado como tentar, no sentido de tentar ao pecado. Mas o que o diabo vê como uma tentação, Deus usa como uma provação para provar a fidelidade de Jesus.

Quinto, durante Seus 40 dias e noites no deserto, Jesus voluntariamente jejuou de comida.  Então Mateus 4:2 diz: “e, tendo jejuado quarenta dias e quarenta noites, depois teve fome”. Isso não é porque não havia comida alguma no deserto. João Batista viveu no deserto por um longo tempo, comendo gafanhotos e mel silvestre (Mt 3:4).

Há duas visões diferentes sobre o “jejum” de nosso Senhor no deserto. Há aqueles como Crisóstomo e John Piper que acreditam que o jejum de Jesus lhe deu força espiritual, preparando-o para ser vitorioso sobre as tentações de Satanás. E há outros, como Calvino e Lutero, que não veem o jejum de nosso Senhor como fortalecimento, mas como enfraquecimento.

O que vemos aqui é um grande contraste entre a tentação de Eva e a de nosso Senhor. Adão e Eva não tinham falta de comida ou água no jardim, e eles caíram ao escolher comer o único alimento proibido. Jesus não tinha comida, e ainda assim Ele resistiu às tentações de Satanás. Mateus mostra a força espiritual de nosso Senhor em Seu momento fisicamente mais fraco.

Isso nos leva a,

2. A Primeira Tentação (Mt 4:3-4)

Mateus 4:3 diz: “E, chegando-se a ele o tentador, disse: Se tu és o Filho de Deus, manda que estas pedras se tornem em pães”

Observe que Mateus se refere a Satanás aqui como “o tentador”. Marcos o chama de “Satanás” (Marcos 1:13), enquanto Lucas o chama de “o diabo” (Lucas 4:2). Mateus está fazendo mais do que meramente identificar o oponente de nosso Senhor; ele está descrevendo sua natureza e seu caráter. Isso é quem Satanás é; isso é o que Satanás faz. Ele é o “tentador” e então, se for bem-sucedido, ele se torna o “acusador” (veja Apocalipse 12:10; Zacarias 3:1).

Aqui, como Jesus estava literalmente faminto e sem nada para comer, o tentador veio até Ele sugerindo que Ele deveria usar Seu poder como Filho de Deus para transformar as pedras em pão e comer. Jesus, é claro, poderia ter feito isso. Ele poderia transformar água em vinho. Ele poderia multiplicar alguns pães e peixes e alimentar milhares.

Qual era a natureza dessa tentação? O ponto de cada tentação deve ser determinado examinando-se de perto tanto a tentação quanto a resposta de Jesus.

Observe que o tentador procurou apelar ao senso de identidade de Jesus. Ele disse: “Se és o Filho de Deus …” (Mt 4:3). Satanás não estava negando que Jesus era o Filho de Deus, o sentido de Suas palavras é “Visto que és o Filho de Deus”. Satanás estava procurando apelar para qualquer egoísmo em Cristo. Era uma tentação usar Sua filiação para Seu próprio conforto, o que seria inconsistente com Sua missão ordenada por Deus. Jesus não veio para satisfazer Seus próprios desejos, mas para fazer a vontade de Seu Pai (Jo 5:30). Jesus diria a Seus discípulos: “A minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra” (Jo 4:34).

Satanás atacou a provisão de Deus: “Certamente o Salvador do mundo precisa de Sua força. Você precisa de comida, ninguém em sã consciência iria mais um segundo. Mas Você está no deserto, e não há nada para comer. Não se preocupe, Você tem o poder de transformar pedras em pão. É isso que você deve fazer”. Que tipo de tentação simples, mas sinistra! Ela apelava ao senso de si mesmo. Estava enraizada em uma necessidade genuína. Estava dentro do poder de Jesus como o Filho de Deus. Mas veio de tal forma a minar a provisão de Deus e a palavra de Deus.

Isso pode não nos parecer tão sério, mas se Jesus tivesse cedido a esse pensamento, a salvação teria sido impossível. Pois naquele momento Jesus teria colocado Sua própria vontade à frente da vontade de Deus. Foi o Espírito Santo que levou Jesus ao deserto e o levou a jejuar por aqueles 40 dias e noites. Usar Seu poder divino para se alimentar seria desobedecer à clara liderança do Espírito Santo e de Seu Pai. E esse egoísmo teria tornado Jesus impróprio como uma oferta pelo pecado.

Como Jesus responde? Com ​​a palavra de Deus. Mateus 4:4, Mas ele respondeu e disse: “Está escrito: 'Nem só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus'”. Não é instrutivo que as primeiras palavras que ouvimos dos lábios de Jesus no Evangelho de Mateus mostraram Sua absoluta confiança nas Escrituras escritas como a Palavra autoritária do Deus vivo. A questão da errância ou irrelevância nunca ocorreu a Ele. Essas noções são de origem satânica (Gênesis 3:1). Ao tentar Eva, o diabo se propôs a fazê-la desconfiar ou distorcer a Palavra de Deus. Jesus pegou e empunhou a arma que ela tão tolamente negligenciou em sua luta com o tentador.

Jesus assumiu o pensamento de que Ele poderia transformar pedras em pão, mas quando Ele colocou esse pensamento contra a Palavra, ele foi claramente visto como falso. Jesus cita aqui Deuteronômio 8:3, “Nem só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus”, como mostrei anteriormente. Agora, se você ler o contexto desse versículo em Deuteronômio, notará estas coisas: 1) Deus enviou Israel ao deserto para prová-los (Dt. 8:2); 2) Deus propositalmente os deixou passar fome (Dt. 8:3); e Deus os alimentou com maná que eles não conheciam (Dt. 8:3); 4) Deus fez isso para que eles aprendessem “que o homem não viverá só de pão; mas o homem viverá de toda palavra que procede da boca do SENHOR” (Dt. 8:3).

Em outras palavras, Deus os deixou com fome e os alimentou com comida celestial para lhes ensinar uma lição. E a lição foi: Deus tem todas as suas necessidades físicas sob controle, então tudo o que você precisa se preocupar são suas necessidades espirituais. De acordo com Deuteronômio 8:4-6, Deus fez a mesma coisa com suas roupas. Ele sobrenaturalmente providenciou sua comida e roupa para que eles vissem que Deus tinha tudo sob controle. Eles não precisavam se preocupar com eles. Jesus ensinará exatamente isso no Sermão da Montanha em Mateus 6:

“Não andeis, pois, inquietos, dizendo: Que comeremos ou que beberemos ou com que nos vestiremos? (Porque todas essas coisas os gentios procuram.) Decerto, vosso Pai celestial bem sabe que necessitais de todas essas coisas; Mas buscai primeiro o Reino de Deus, e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão acrescentadas” (Mateus 6:31-33)

Israel exigiu seu pão, mas morreu no deserto; Jesus negou a si mesmo o pão, reteve Sua justiça e viveu pela submissão fiel à Palavra de Deus. A fome de Israel tinha a intenção de mostrar a eles que ouvir e obedecer à palavra de Deus é a coisa mais importante na vida (Dt 8:2–3). Hebreus 5 diz que “embora fosse Filho, aprendeu a obediência pelas coisas que sofreu” (Hb 5:8). Mais necessária do que pão para Jesus era a obediência à Palavra de Deus. Jesus superou a tentação de transformar pedras em pão para satisfazer Sua própria fome crendo na palavra de Deus. Jesus se concentrou no eterno, no espiritual, na palavra de Deus, em Seu Pai, na obediência.

Jesus seguiu a liderança do Espírito Santo. Ele confiou na palavra de Deus. Ele confiou na provisão de Deus. Jesus venceu a tentação. Ele passou na prova. A prova demonstrou Suas qualificações como o Filho de Deus e o Salvador do mundo. Em vez de transformar pedras em pão para satisfazer Sua fome, Ele se tornou o pão vivo para satisfazer a fome de todos os que creem Nele. Em João 6, Jesus disse:

“Eu sou o pão da vida. Vossos pais comeram o maná no deserto e morreram. Este é o pão que desce do céu, para que o que dele comer não morra. Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém comer desse pão, viverá para sempre; e o pão que eu der é a minha carne, que eu darei pela vida do mundo” (João 6:48-51)

O pão que Deus deu a Israel no deserto sustentou a vida física, mas não concedeu vida eterna. Jesus, o “pão verdadeiro”, fornece vida eterna por meio de Seu sacrifício na cruz. E Jesus demonstra Seu compromisso de ser obediente à vontade do Pai aqui, bem no começo.

Este é o primeiro “enfrentamento” entre Satanás e o Salvador, embora não seja o último. Mas neste encontro com Seu arqui-inimigo, Jesus prevaleceu. Mateus está informando seus leitores, eu acredito, que este é um antegozo das “coisas que virão”. Ele nos deixa saber no início de seu Evangelho que Jesus sempre vence Satanás. A vitória de nosso Senhor no deserto é o “primeiro fruto” da vitória maior que nosso Senhor ganhará na cruz do Calvário, a mesma coisa que o sucesso de Satanás na tentação teria impedido. Continua no próximo estudo...

A Segunda Tentação

A Terceira Tentação 

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